Demanda Agregada I: Construindo o Modelo IS-LM

1 - O MERCADO DE BENS E A CURVA IS

A curva IS representa por meio de um gráfico a relação entre a taxa de juros e o nível de renda que surge no mercado de bens e serviços. Para desenvolver essa relação, começamos com um modelo básico conhecido como cruz keynesiana.

A Cruz Keynesiana

Keynes propôs que a renda total de uma economia era, no curto prazo, determinada em grande parte pelo planejamento de gastos por partes dos domicílios, das empresas e do governo. Quanto mais as pessoas desejam gastar, maior a quantidade de bens e serviços que as empresas conseguem vender. Quanto mais as empresas conseguem vender, maior a quantidade de produtos que elas optam por produzir e maior a quantidade de trabalhadores que elas optam por contratar. Keynes acreditava que o problema durante os períodos de depressão era uma inadequação nos gastos. A cruz keynesiana é uma tentativa de modelar esse raciocínio.

Gasto Planejado

Começamos nossa derivação da cruz keynesiana fazendo a representação gráfica da diferença entre gasto efetivo e gasto planejado. Gasto efetivo corresponde ao montante que os domicílios, as empresas e o governo gastam com bens e serviços e é igual ao PIB da economia. Gasto planejado corresponde ao montante que os domicílios, as empresas e o governo gostariam de despender com bens e serviços.

Por que o gasto efetivo diferiria do gasto planejado? A resposta é que as empresas poderiam passar a ter um investimento não planejado em estoques pelo fato de as vendas não corresponderem às suas expectativas. Quando as empresas vendem uma quantidade menor do que planejavam em relação a seus produtos, o volume de estoque automaticamente cresce; por outro lado, quando as empresas vendem uma quantidade maior do que planejavam em relação a seus produtos, o volume de seus estoques diminui. Uma vez que essas variações não planejadas nos estoques são contabilizadas como dispêndio com investimentos por parte das empresas, o gasto efetivo pode se posicionar tanto acima quanto abaixo do gasto planejado.


Partindo do pressuposto de que a economia é fechada, de tal modo que as exportações líquidas sejam iguais a zero, escrevemos o gasto planejado, PE, como a soma entre consumo, C, investimento planejado, I, e compras do governo, G:

PE = C + I + G

A essa equação acrescentamos a função de consumo.

C = C(Y - T)

Para simplificar, consideramos, por enquanto, que o investimento planejado é determinado de maneira exógena:

I = Ī

Por fim, partimos do pressuposto de que a política fiscal é fixa:

G = Ḡ
T = Ṫ

Combinado as equações acima:

PE = C(Y - Ṫ) + Ī + Ḡ

Essa equação mostra que o gasto planejado é uma função da renda, Y, do nível de investimento, Ī, e das variáveis da política fiscal, Ḡ e Ṫ.

A figura abaixo representa sob a forma de um gráfico o gasto planejado como uma função do nível de renda.
















A economia em equilíbrio

A próxima peça da cruz keynesiana é o pressuposto de que a economia se encontra em equilíbrio quando o gasto efetivo é igual ao gasto planejado.

Gasto Efetivo = Gasto Planejado
Y = PE

A reta 45 da figura abaixo representa, sob a forma de um gráfico, os pontos nos quais essa condição permanece válida. Com o acréscimo da função do gasto planejado, esse gráfico passa a ser uma cruz keynesiana. O equilíbrio dessa economia está no ponto A, onde a função do gasto planejado cruza a reta com 45 graus.



















Nesse modelo, os estoques desempenham um papel importante no processo de ajuste. Sempre que uma determinada economia não está em equilíbrio, as empresas enfrentam mudanças não planejadas de estoques, e isso induz essas empresas a modificar seus respectivos níveis de produção. As mudanças na produção, por sua vez, influenciam a renda total e o gasto total, conduzindo a economia na direção do equilíbrio.





















A cruz keynesiana mostra o modo como a renda, Y, é determinada para níveis específicos de investimentos planejado, I, e políticas fiscais, G e T. Podemos utilizar esse modelo para mostrar como a renda se altera quando uma dessas variáveis exógenas se modifica.

Política Fiscal e o Multiplicador: Compras do Governo

Uma vez que as compras do governo constituem um dos componentes da despesas, um maior volume de compras do governo resulta em gasto planejado mais elevado para qualquer nível de renda especificado. Se as compras do governo crescem em uma quantidade equivalente a ΔG, a curva para o gasto planejado se desloca para cima em ΔG, como ilustra a figura abaixo.




















Esse gráfico demonstra que um crescimento nas compras do governo acarreta um crescimento ainda maior na renda. Ou seja, ΔY é maior que a ΔG. A proporção ΔY/ΔG é conhecida como multiplicador das compras do governo. Uma implicação da cruz keynesiana é que o multiplicador das compras do governo é maior do que 1.

O motivo disso acontecer é que, de acordo com a função do consumo C = C(Y-T), uma renda mais alta acarreta maior consumo. Quando um aumento nas compras do governo faz a renda crescer, isso também faz com que a cresça o consumo, o que faz com que cresça ainda mais a renda, que faz crescer ainda mais o consumo, e assim sucessivamente.

Podemos escrever o multiplicador como sendo:

ΔY/ΔG = 1/(1-PMgC)

Política Fiscal e o Multiplicador: Impostos

Vamos considerar agora como as alterações nos impostos afetam a renda de equilíbrio. Uma redução nos impostos equivalente a ΔT imediatamente faz com que cresça a renda disponível, Y- T, em ΔT e, por conseguinte, faz com que cresça o consumo em PMgC x ΔT. Como demonstra a figura abaixo, a reta para o gasto planejado se desloca para cima em PMgC x ΔT.



Exatamente do mesmo modo que um crescimento nas compras do governo exerce um efeito multiplicador sobre a renda, acontece com uma diminuição nos impostos. O efeito geral sobre a renda decorrente da alteração nos impostos é:

ΔY/ΔT = -PMgC/(1-PMgC)

A taxa de juros, o investimento e a curva IS

A cruz Keynesiana é útil pois mostra como os planos de gastos dos domicílios, das empresas e do governo determinam a renda da economia. contudo, ela parte do pressuposto simplificador de que a o nível de investimento planejado, I, é fixo. Uma importante relação macroeconômica é que o investimento planejado depende da taxa de juros, r.

Para acrescentar ao nosso modelo essa relação entre taxa de juros e investimento, escrevemos o nível de investimento planejado sob a forma:

I = I(r)

Essa função do investimento está representada sob a forma de um gráfico no painel (a) da figura abaixo.


Uma vez que a taxa de juros corresponde ao custo de tomar emprestado para financiar projetos de investimento, um aumento na taxa de juros reduz o investimento planejado. Como resultado,a  função do investimento se inclina em sentido descendente.

A redução no investimento planejado, por sua vez, desloca para baixo a função do gasto planejado, como ilustra o painel (b) da figura abaixo:



O deslocamento na função do gasto planejado faz com que o nível de renda caia de Y1 para Y2. Portanto, um aumento na taxa de juros faz com que a renda seja reduzida.

A curva IS, apresentada no painel (c) da figura abaixo, sintetiza essa relação entre a taxa de juros e o nível de renda.




Cada um dos pontos na curva de IS representa equilíbrio no mercado de bens, e a curva ilustra o modo como o nível de equilíbrio da renda depende da taxa de juros.

Como a Política Fiscal Desloca a Curva IS

A curva IS mostra as combinações entre a taxa de juros e o nível de renda que são condizentes com o equilíbrio no mercado de bens e serviços. A curva IS é desenhada para uma determinada política fiscal. Mudanças na política fiscal que façam crescer a demanda por bens e serviços deslocam a curva IS para a direita. Mudanças na política fiscal que reduzam a demanda por bens e serviços deslocam a curva IS para a esquerda.




2 - O MERCADO MONETÁRIO E A CURVA LM

A curva LM representa graficamente a relação entre a taxa de juros e o nível de renda que ocorre no mercado para encaixes monetários. 

A Teoria da Preferência pela Liquidez

Se M representa a oferta monetária e P representa o nível de preços, então M/P representa a oferta de encaixes monetários reais. A teoria da preferência pela liquidez pressupõe que existe uma oferta fixa de encaixes monetários reais. Ou seja, 

(M/P)^s =  Ṁ/Ṗ

A oferta monetária, M, é uma variável exógena da política econômica escolhida por um determinado banco central. O nível de preços, P, também é uma variável exógena nesse modelo. Esses pressupostos sugerem que a oferta de encaixes monetários reais é fixa e, em particular, não dependem da taxa de juros. Consequentemente, quando representamos por meio de um gráfico a oferta de encaixes monetários reais em relação à taxa de juros da figura abaixo, obtemos uma curva de oferta com formato vertical.



Em seguida, considere a demanda por encaixes monetários reais. A teoria da preferência pela liquidez postula que a taxa de juros é um determinante para a quantidade de moeda corrente que as pessoas optam por ter em mãos. Podemos escrever a demanda por encaixes monetários reais sob a forma

(M/P)^d = L(r)

Em que a função L(r) mostra que a quantidade de moeda corrente demandada depende da taxa de juros.

De acordo com a teoria da preferência pela liquidez, a oferta e a demanda por encaixes monetários reais determinam qual a taxa de juros que prevalece na economia. Ou seja, a taxa de juros se ajusta a fim de equilibrar o mercado monetário. Na taxa de juros de equilíbrio, a quantidade demandada de encaixes monetários reais é igual à respectiva quantidade ofertada.

De que modo a taxa de juros chega a esse equilíbrio entre oferta de moeda corrente e demanda por moeda corrente? O ajuste ocorre porque, sempre que o mercado monetário não está em equilíbrio, as pessoas tentam ajustar suas carteiras de ativo e, nesse processo, alteram as taxas de juros. 

Suponha, por exemplo, que o banco central repentinamente diminua a oferta monetária. Uma queda em M faz com que se reduza M/P, já que P é constante no modelo. A oferta de encaixes monetários reais se desloca para a esquerda, como ilustra a figura abaixo.


A taxa de juros de equilíbrio cresce de r1 para r2, e a taxa de juros mais alta faz com que as pessoas fiquem satisfeitas em reter em mãos menores quantidades de encaixes monetários reais. O oposto ocorreria se o banco central tivesse repentinamente aumentado a oferta monetária. Por conseguinte, de acordo com a teoria da preferência pela liquidez, uma redução na oferta monetária faz com que cresça a taxa de juros, enquanto um aumento na oferta monetária faz com que decresça a taxa de juros.

Renda, Demanda por Moeda e a Curva LM

O nível de renda afeta a demanda por moeda corrente. Quando a renda é alta, o gasto é alto, de modo que as pessoas se envolvem em um maior número de transações que exigem o uso de moeda corrente. Consequentemente, maior renda acarreta maior demanda por moeda. Podemos expressar essas ideias escrevendo a função da demanda por moeda sob a forma

(M/P)^d = L(r,Y)

A quantidade demandada de encaixes monetários reais é negativamente relacionada com a taxa de juros e positivamente relacionada com a renda.

Utilizando a teoria da preferência pela liquidez, podemos conjecturar sobre o que acontece com a taxa de juros quando o nível de renda se modifica.


Considere o que acontece na figura acima quando a renda aumenta de Y1 para Y2. Conforme ilustra o painel (a), esse crescimento na renda desloca para a direita a curva de demanda por moeda corrente. Com a oferta de encaixes monetários reais inalterada, a taxa de juros deve necessariamente crescer de r1 para r2 para equilibrar o mercado monetário. Portanto, de acordo com a teoria da preferência pela liquidez, maior o nível de renda acarreta uma taxa de juros mais elevada.

A curva LM ilustrada no painel (b) da figura acima realiza uma síntese dessa relação entre o nível de renda e a taxa de juros. Cada um dos pontos da curva LM representa um equilíbrio no mercado monetário, enquanto a curva ilustra o modo como a taxa de juros de equilíbrio depende do nível de renda. Quanto mais elevado o nível de renda, mais alta a demanda por encaixes monetários reais e mais alta a taxa de juros de equilíbrio. Por essa razão, a curva LM apresenta inclinação ascendente.

O Modo como a Política Monetária Desloca a Curva LM

A curva LM nos informa a taxa de juros que equilibra o mercado monetário em qualquer nível de renda. Contudo, conforme verificamos anteriormente, a taxa de juros de equilíbrio também depende da oferta de encaixes monetários reais, M/P. Isso significa que a curva LM é projetada para uma determinada oferta de encaixes monetários reais. Se existe alguma alteração de encaixes monetários reais, a curva LM se desloca.

suponha que o banco central diminua de M1 para M2 a oferta monetária, o que faz com que a oferta de encaixes monetários reais diminua de M1/P para M2/P. A figura abaixo demonstra o que acontece. 



Mantendo-se constante constante o montante da renda e, por conseguinte, a curva da demanda por encaixes monetários rais, verificamos que uma redução na oferta de encaixes monetários reais faz com que se eleve a taxa de juros que equilibra o mercado monetário. Assim, uma redução na oferta monetária desloca para cima a curva LM.

Em resumo, a curva LM mostra as combinações entre a taxa de juros e o nível de renda que são condizentes com o equilíbrio no mercado de encaixes monetários reais. A curva LM é desenhada para uma determinada oferta de encaixes monetários reais. Reduções na oferta de encaixes monetários reais deslocam para cima a curva LM. Aumentos na oferta de encaixes monetários reais deslocam para baixo o curva LM. 

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