CESPE - Analista do Ministério Público da União/Apoio Jurídico/Direito/2013

O direito a distância semelha um bloco de justiça como a montanha semelha um bloco de azul. E é isso a justiça: um azul de montanha. À medida que nos aproximamos, esse azul se esvai. A nitidez e a harmonia desfazem-se num turbilhão caótico de detalhes grosseiros.

A beleza do direito transfunde-se no cipoal entrançado do formalismo. Ao que nele penetrou espanta somente encontrar fórmulas, só ouvir fórmulas, só conseguir fórmulas — tudo amarelo, cor de ouro, e nada, nada azul, a cor da justiça. O azul, a justiça, a harmonia, a equidade — puras ilusões da ótica humana.

Velhíssimas umas, vindas da Roma imperial, vindas da Idade Média; outras mais novas, nascidas no solo pátrio; mas só isso: fórmulas e  fórmulas.

Tenho meu Eu bipartido. Um mora no azul, libérrimo como as andorinhas, isolado, desconhecido de todos, sem irmão, sem Senhor. O outro, coitado, mora na cidade da Fórmula, escravo assoldado às necessidades prosaicas da vida. Que nítido exemplo da dualidade humana!

Quando o escravo vai à labuta, o outro voa às alturas, enojado. À noite, nesse momento calmo em que o isolamento e o silêncio nos  integram, os dois irmãos se encontram e confabulam ou filosofam.
 
José Bento Monteiro Lobato. Literatura do minarete. São Paulo: Globo, 2008, p. 265 (com adaptações).

A respeito das ideias e estruturas linguísticas do texto acima, julgue o item que se segue.

Na linha 10, o emprego do sinal indicativo de crase é facultativo em “à labuta” e “às alturas”; por isso, sua omissão não traria prejuízo para correção gramatical do período.

Resolução:

Gramaticalmente, o sinal indicativo de crase, nos dois casos, é obrigatório. Vejamos:

1) Quando o escravo vai à labuta. Nessa crase, há um preposição que decorre da regência do verbo ir em vai. Quem vaivaia algum lugar, por exemplo. Então, esse primeiro é obrigatório. Já em a labuta, é possível constatar que há um há artigo que se refere ao substantivo feminino labuta. Perceba que, nesse caso, você não pronuncia, habitualmente, a palavra labutasem o artigo antecedendo-a, pois há qualquer coisa de especificação, de determinação, de detalhamento do substantivo nesse caso. Para efeito comparativo, imagine que a regência do verbo ir fosse em no lugar de a. Como você pronunciaria essa frase? Certamente, seria assim: O escravo vai na labuta. Assim, a = à. Crase obrigatória.

2) o outro voa às alturas
. Nesse caso, a crase também é obrigatória porque está indicando circunstância de lugar com substantivo feminino. "Fracionando" os elementos que compõem essa crase, teríamos o seguinte: o outro voa até asalturas. Agora, substituindo a preposição até pela preposição a, teremos: a + as alturas. Logo, a + a = à. Note que, se a crase fosse facultativa, haveria prejuízo à correção gramatical do período.

Gabarito: Errado




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