SECURITIZAÇÃO E CRÉDITO ESTRUTURADO



CRÉDITO ESTRUTURADO

Ao contrário das formas tradicionais de dívidas, operações estruturadas de crédito permitem mitigação de risco através de:

■ Garantias reais (alienação fiducária, hipoteca, direitos sobre recebíveis - over collateral ou não, aplicações financeiras em geral, ações ou cotas, fianças, seguros de crédito) ou fidejussórias (aval de sócios, de terceiros): Reduz o risco, pois eleva a expectativa de recebimento em caso de default. 

■ Procedimentos operacionais que direcionem ou garantam o fluxo de recursos ao credor. Ex: apontamento de conta para pagamento dos recebíveis, escrow accounts / contas vinculadas, convenants, registro em cartório, formatação jurídica da dívida (Ex: CCB). São contas que, às vezes nem passam pelo cedente do crédito (que tomou o empréstimo).

■ Proteção aos índices de Basiléia do credor. Ex: cessão definitiva de dívidas, vinculação à Res. CMN 2921.

■ Receitas extras para o estruturador (instituição financeira): fees de estruturação e distribuição e possibilidade de captação de recursos com lastro na dívida (ex: LCI, LCA e DPGE).

■ Securitização de ativos.

Perceba que securitização é uma forma de crédito estruturado, um pouca mais sofisticada. Mas nem todo crédito estruturado é uma securitização.

Na prática quando uma instituição financeira consegue organizar um conjunto de recebíveis, empacotá-los com outros diretos (e também deveres) e oferecer ao público em geral, trata-se de crédito estruturado.

Antes de prosseguir, uma explicação para o que seria over collateral. Collateral, falando em termos simples, seria a separação de algum ativo em garantia de uma dívida, que poderá ser "chamado" para honrar o pagamento da mesma. Over Collateral, é quando a instituição oferece MAIS garantias do que o valor da dívida. Isso é comum em FIDCs, pois permite que o gestor do fundo troque créditos ruins por créditos bons, pois tem mais direitos do que o valor da dívida.


Securitização

Vem da expressão em inglês "securities", o que nos leva a entender securitização como o processo de transforma um conjunto de instrumentos financeiros em uma security (valor mobiliário) com características próprias, contrato próprio.

Processo pelo qual um emissor segrega um portfólio de ativos e emite um novo instrumento de dívida ou valor mobiliário por meio de um veículo independente com prioridades distintas de recebimento em relação ao portfólio original.

São exemplo de securitização:

■ Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDCs)

■ Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) emitidos por securitizadoras

■ Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) emitido por securitizadoras

■ Certificado de Cédula de Crédito Bancário (CCCB) emitidos por instituição financeiras IF

■ Certificados de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA)

É importante notar que alguns sites definem notar que alguns sites definem securitização pelo lado do passivo, ou seja, do devedor. Mas é uma visão inadequada para a realidade brasileira, pois o que se transfere REALMENTE é o direito de recebimento. Apesar de ser uma dívida de alguém, normalmente quem empacota é quem tem direito de receber e não de pagar.

Antes de prosseguir definido as características dos principais veículos de securitização, vale mostrar o modelo norte-americano que deu origem a alguns dos instrumentos securitizados que temos por aqui.

Vejam o filme "A Grande Aposta", pois há uma ótima discussão sobre CDOs e CDSs, instrumentos que trataremos nessa aula e adiante.


CDO - Collaterallized Debt Obligation

Esse instrumento foi bastante criticado durante a crise do subprime nos EUA, pois permitiu uma expansão muito rápida dessas hipotecas de alto risco.

Antes da "invenção" do CDO, as hipotecas de alto risco acabavam ficando na carteira dos emissores, pois não havia demanda para tamanho risco. Grandes compradores como os fundos de pensão não poderiam investir nesses títulos e hedge funds achavam que o risco não compensariam o retorno.

Imagine um banco que empresta dinheiro para interessados em comprar imóveis. Concede, por exemplo, R$ 1 bilhão em créditos imobiliários, garantidos pelos imóveis.

Esses R$ 1 bilhão gerarão um fluxo anual de, digamos, R$ 100 milhões por ano.

Antes dos CDOs, para passarem esses créditos adiante, os bancos criavam uma SPE (sociedade de propósito específico) que recebia os direitos de todos esses créditos.

Essa SPE teria, então, o direito de receber o dinheiro dos mutuários e ainda levava as garantias dos imóveis. O que fazia essa SPE? Emitia cotas, por hipóteses, 1 milhão de cotas e fazia um IPO (initial private offer) ou uma emissão privada, para captar o dinheiro e repassar ao banco, como contrapartida da cessão dos créditos (compra de carteira de créditos).

Antes de ir a mercado o banco (ou a SPE) contratava uma agência classificadora de risco (rating agency, como Moody's, S&P, Fitch etc) para indicar qual seria o risco daquele pacote de recebíveis (normalmente diversificado). Imaginemos que o risco ficasse em BB (nem ruim, nem bom).

Para esse risco de crédito as pessoas aceitariam, por exemplo, receber 9% ao ano.

Uma conta simples mostra que, 9% ao ano, o valor presente do fluxo (consideraremos perpétua apenas para fins de ilustração) seria de R$ 1,1 bilhão (R$ 100.000.000/0,09).

A SPE vende então as cotas e capta R$ 1,1 bi e paga ao banco esse valor. O banco já tem um ganho de 10% (de R$ 1 bi para R$ 1,1 bi) e os cotistas da SPE ficaram com o risco dos mutuários. O banco, com esse dinheiro, pode emprestar novamente a outros mutuários.

Uma cota desse SPE é um ativo securitizado. É uma MBS (mortgage backed security). Se na SPE houvesse outros ativos, como crédito estudantil, crédito privado de longo prazo, etc. Suas cotas (ativo) seriam classificadas como ABS (asset backed security).

Isso é interessante, mas não atendia a públicos que precisavam de mais segurança (fundos de pensão) e também àqueles com maior apetite para o risco (hedge funds).

O CDO veio transformar essa SPE num veículo que pudesse atender a diversos públicos, diversos apetites por risco e retorno.

Imagine que a mesma SPE, porém, em de oferecer MBSs sem distinção entre eles (todos com o mesmo risco, pagando 9% ao ano no máximo), conferisse às cotas algum grau de prioridade no recebimento dos pagamentos dos mutuários.

Pensemos o seguinte: 40% das cotas estariam em uma tranche (divisão) Sênior, que teria prioridade de recebimento em relação às outras. 40% das cotas estariam numa tranche intermediária, chamada mezanino, e receberia após o pagamento das cotas senior. 

Por fim, há uma tranche subordinada (20% das cotas), que é a primeira a arcar com qualquer default ou crédito não performado.

A SPE tem todo o direito de fazer isso. Ela não é obrigada a vender cotas com direitos iguais.

Se temos uma estrutura como essa e aqueles R$ 100.000.000 que vêm todo ano têm uma estimativa média de apenas 3% de inadimplemento, quando é que as tranches superiores vão parar de receber seus valores?

Praticamente nunca. Por isso elas eram classificadas pelas agências de risco como AAA, ou risco baixíssimo. Como são AAA podem pagar, por hipótese, 6% ao ano e podem ser vendidas para fundos de pensão, pois são de risco baixo e são aceitas pelas regras desses veículos.

As tranches também são quase inatingíveis, pois o default só começaria a atingi-las se a inadimplência chegar a níveis absurdamente altos. As agências poderiam classificá-las como AA ou A. Por serem de baixo risco, poderiam se contentar com, por exemplo, 8%.

Então temos 40% das cotas vendidas para tranches senior, 40% para tranches mezanini e 20% para tranches subordinadas, junior ou equity.

Lembre-se que a SPE vendeu os títulos por R$ 1,1 bi (10% a mais do que crédito original, que foi o ganho do banco).

Vamos assumir que as cotas senior pagaram R$ 440.000.000 pelo direito, as cotas mezanino R$ 440.000.000 e as cotas equity 220.000.000, totalizando R$ 1,1 bilhão. Cada cota tem um valor igual, porém diritos diferentes.

Dos R$ 100.000.000 por mês, quando deveria ser destinado para cada tranche?

■  R$ 440 milhões x 6% = R$ 26,4 milhões
■  R$ 440 milhões x 8% = R$ 35,2 milhões
■  Para as cotas júnior ou equity, o que sobra = R$ 38,4 milhões menos a inadimplência.
■  Como eles (equity) pagaram R$ 220 milhões, a rentabilidade da cota júnior, se todos pagarem, seria de 17,45% (38,4/220).

Nos EUA imaginava-se que, mesmo em empréstimos imobiliários de alto risco, a inadimplência jamais passaria de 8%. Se ocorresse essa inadimplência, no caso, sobraria para as cotas junior R$ 30,4 milhões, uma rentabilidade de 13,81%.

Perceba algo interessante nesse instrumento financeiro.

Não é o risco específico dos ativos ou dos empréstimos que "cria" as tranches AAA, mas a diferenciação de direitos sobre o crédito DENTRO do próprio veículo financeiro (SPE).

Por isso havia nos EUA CDO's com tranches AAA mesmo que TODOS os seus recebíveis fossem de baixa qualidade. Como a inadimplência, mesmo quando muito alta, não passaria de 8% a 10%, as tranches superiores SEMPRE receberiam seus direitos.

Naturalmente os bancos não contavam que a inadimplência, principalmente para hipotecas subprime, de alto risco, bateria todos os recordes e destruiria o valor desses ativos garantidos nas dívidas.

Aqui no Brasil os CRAs, CRIs e os FDICs costumam ter estrutura semelhante a essa. 

Só que, como são muitas vezes ativos garantidos em recebíveis de uma empresa do agronegócio ou incorporadora imobiliária, os próprios originadores do crédito integralizam as cotas júnior, como forma de compromisso com a operação. Assumem o primeiro risco de default.

Após a crise do subprime os CDOs passaram a ser visto como veículos para fraude, mas, como deve ter ficado claro, são apenas uma engenhosa forma de atender diferentes públicos com um mesmo ativo, de risco homogêneo.

Apesar de parecer estranho empacotar um monte de hipotecas com risco CCC, péssimos pagadores, e conseguir extrair desse veículo (SPE) cotas com classificação AAA, não há nada de errado, impossível ou fraudulento nisso.

Ainda que a inadimplência pudesse chegar a 50%, as tranches mais elevadas continuaram a receber sua remuneração contratada. 

Ainda que possa ter havido fraudes no mercado americano, a estrutura de um CDO não é, em si, fraudulenta. É bem engenhosa e continua servindo muito bem ao mercado de crédito, inclusive no Brasil (onde há diferenças da estrutura, mas o conceito é o mesmo).

Antes de falar propriamente dos instrumentos securitizados, precisamos introduzir os conceitos de LCI e LCA, que são instrumentos de captação bancário, com destinação dos recursos para a área imobiliária e do agronegócio.



LCI - Letra de Crédito Imboliário

É um instrumento de captação bancária e seus recursos captados devem ser aplicados em financiamento imobiliários. 

A LCI tem sido um dos instrumentos de renda fixa mais procurados pela investidor pessoa-física, por contar com isenção de Imposto de Renda para esse pública (quase extinta por medida provisória em 2015, ainda há risco de extinção dessa isenção). Representa uma importantíssima fonte de recursos para o setor imobiliário, pois possui como lastro créditos imobiliários.

São emitidas por instituições financeiras (IFs) - bancos comerciais, múltiplos e de investimento, além de sociedades de crédito imobiliário, associações de poupança e empréstimo e companhias hipotecárias - e são regulamentadas pela a Lei n° 10.931/2004e a Circular do Banco Central n° 3.614/12 (leitura recomendada). Sua remuneração pode ser taxa pré ou pós fixada. 

Importante que o investidor saiba que, ao comprar uma LCI, assume o risco primário do emissor (Instituição Financeira) e conta com a segurança adicional de estar vinculado à carteira de crédito imobiliário da instituição financeira. A LCI é elegível às regras de cobertura do Fundo Garantidor de Crédito (FGC).

Normalmente a LCI não pode ser resgatada a qualquer momento, mas é possível negociá-la no mercado secundário. O prazo mínimo de vencimento desse ativo varia de acordo com o indexador que possui. São 36 meses quando o título for atualizado mensalmente por índice de preços ou 12 meses se for atualizado por esse indexador. Se não utilizar índices de preços, é de 90 dias. Esses prazos devem ser contados a partir da data que um terceiro, pessoa física ou jurídica, adquira o título da instituição emissora. Nesses períodos, a instituição emissora não poderá recomprar ou resgatar a LCI.

De acordo com essa norma, as operações de crédito imobiliários vinculadas à LCI devem ser utilizadas como lastro pelo seu valor líquido, deduzido da obrigação com que tiver relacionada (custo e fees).

Deve ser identificado, no registro da LCI da Cetip, as condições da emissão e os créditos que lastreiam a operação. Entre os tipos de lastro estão: financiamento habitacionais garantidos por hipoteca ou alienação fiduciária de bens imóveis, sejam eles contratados ou não pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH); empréstimos garantidos por hipoteca ou alienação imobiliária de bens imóveis residenciais; e outros empréstimos ou financiamentos garantidos por hipoteca ou alienação fiduciária de bens imóveis.

Aqui vale pontuar a diferença entre hipoteca e alienação fiduciária. Na hipoteca o imóvel é dado como garantia. Se o tomador não quitar o empréstimo, o imóvel pode ser tomado para honrar a dívida. Na alienação fiduciária, o imóvel fica com gravame com o nome do financiador até a quitação da dívida.

Uma coisa bem interessante é debater COMO as LCIs conseguem ter taxas tão altas. Alguns bancos oferecem 103% do CDI, para prazos mais longos. Isso, sem Imposto de renda, é uma maravilha para o investidor. Em bancos grandes esse percentual cai bastante, entre 85% e 95% do CDI, a depender do valor e do prazo.

Mas quem já pegou financiamento imobiliário sabe que às vezes se paga, mesmo fora do SFH (que tem funding subsidiado), 80 a 85% do CDI como taxas de empréstimo.

Mesmo comprando na planta, o mutuário paga uma atualização mínima pelo INCC.

Como é possível que a instituição financeira capte a 95% do CDI e empreste para quem vai repassar esse crédito a 85% do CDI (construtora ou incorporadora)?

Normalmente as taxas não se referem a empréstimos FINAIS, em que financiamos o tomador final (mutuário da casa própria). É um sistema de funding (recursos para financiamento) do sistema das incorporadoras, construtoras. Vejamos.

Imagine que uma rede de supermercados contratou uma construtora para fazer uma nova sede. A construtora orça o prédio em R$ 100.000.000, e faz um contrato de alienação fiduciária em que o supermercado pagará, por hipótese, 9% ao ano (cerca de 75%-80% do CDI).

Como a construtora precisará de R$ 40 milhões para construir o imóvel, ela pode captar dinheiro junto a um banco dando como garantia esses recebíveis imobiliários (o contrato de alienação fiduciária).

Ela vai pagar ao banco, por exemplo, 16% ao ano, sobre R$ 40 milhões (6,4 milhões) e receberá R$ 9 milhões.

Durante os 3 anos de construção, funcionaria assim. Ao final, a construtora repassaria (em outras condições) o contrato inteiro para uma instituição financeira.

Imagine que o saldo devedor do comprador e da construtora, ao final da construção, sejam os mesmos (R$ 100 mi e R$ 40 mi). Isso porque, por hipótese, só pagaram os juros e não amortizaram o principal (esqueçamos ajustes de TR por simplificação).

O contrato de 9% ao ao continuaria dando 9% de juros + amortização. A construtora não é banco, não quer esse contrato de 30 anos. Ela pode vender esse contrato, por hipótese, por R$ 50 milhões, quitar seu saldo devedor de R$ 40 milhões e ficar com o lucro de R$ 10 milhões.

Além do lucro da diferença entre os juros que pagou e que recebeu.

O contrato paga, por ano, R$ 9 milhões. O banco comprou esse direito por 50 milhões. Isso significa juros da ordem de 18% ao ano.

Perceba como há espaços para que todos ganhem nesse mercado.

É claro que, na prática, as coisas são mais amarradas e não há tanta margem financeira assim. Mas é só para ilustrar como os instrumentos de venda e cessão de crédito podem aliar taxas de captação e empréstimo tão díspares.

Onde entra a LCI nisso? O banco não usa dinheiro próprio para emprestar à construtora, emite as LCIs com ótima rentabilidade, capta junto a investidores e repassa os recursos "carimbados" ao setor imobiliário.



LCA - Letra de Crédito do Agronegócio

É um título vinculado a crédito do Agronegócio.

A LCA é um título emitido por uma instituição financeira. É utilizada para captar recursos para participantes da cadeia do agronegócio. O instrumento foi criado pela Lei n° 11.076 (leitura recomendada). Os papéis têm como um de seus diferenciais o fato de que os investidores pessoa físicas têm seus rendimentos isentos de IR (há risco de tributação via medida provisória). Outro diferencial é o fato de as LCAs emitidas a partir de 23 de maio de 2013 terem cobertura do FGC, até o limite estabelecido pelo Fundo para recursos numa mesma instituição. O prazo mínimo varia de acordo com o indexador que possui. Para a Taxa DI-Cetip é de 90 dias.

O risco primário da LCA é da instituição financeira, como na LCI. Na inadimplência do banco, o lastro está penhorado por lei ao investidor final que pode requisitar sua propriedade ao juiz quando o banco não pagar o ativo.

Na Cetip, para registrar a LCA, a instituição financeira emissora deve fazer o devido registro do lastro (recebíveis do agronegócio). Um dos diferenciais das LCAs registradas na Cetip é a variedade de lastro (garantias) que podem ser atrelados a elas. Como lastro, entendem-se os direitos creditórios vinculados a produtores rurais, suas cooperativas, e terceiros, inclusive empréstimos e financiamentos relacionados com a produção, comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos ou insumos agropecuários ou de máquinas e implementos utilizados nesse setor.

Entre os exemplos de instrumentos que servem como lastro dessas operções: Cédula de Produto Rural (CPR), notas promissórias rurais, CRH - Cédula Rural Hipotecária, CRPH - Cédula Rural Pignoratícia Hipotecária, o CCB de origem do agronegócio, a NCE - Nota de Crédito à Exportação, a CCE - Cédula de Crédito à Exportação, o CDA/WA - Certificado de Depósito Agropecuário, o Warrante Agropecuário e a NCR - Nota de Crédito Rural. O Contrato Mercantil também pode ser usado como lastro.

Outra funcionalidade é o lastro revolvente, que possibilita gestão de lastro de ciclo curto que sejam integrantes de uma cesta de garantias (como no caso das garantias flutuantes). Ou seja, aqueles com vencimento inferior ou igual à data de vencimento do título, cuja produção se esgota antes do prazo das respectivas LCAs. Por meio dele é possível gerenciar alguns lastros de forma mais otimizada, renovando-os conforme o comportamento da produção, e alongando a maturidade do papel.

A estrutura de captação do produtor rural vai ser melhor exemplificado quando falarmos de CRA.



Securitizadoras 

Antes de falarmos dos CRIs e dos CRAs, é importante conhecer o papel das securitizadoras.

As companhias securitizadoras são instituições não financeiras, constituídas na forma de sociedade por ações, cujo objetivo é adquirir direitos creditórios e securitizá-los mediante a emissão de Certificados de Recebíveis (CR) no mercado de capitais, podendo emitir outros títulos de crédito, realizar negócios e prestar outros serviços compatíveis com as suas atividades.

Securitizar é o processo de transforma um conjunto de recebíveis em um valor mobiliário (securities), com características próprias e negociados de forma independente. 

CRI - Certificado de Recebíveis Imobiliários

Importante distinguir aqui Letra de Certificado. Letra, normalmente, é instrumento de captação de instituições financeiras, são emitidos por elas e o risco do crédito é o risco da própria IF emissora. Certificados são instrumentos de repasse de direitos creditórios, ou seja, representam esses direitos.

O CRI é o valor mobiliário-VM (ativo securitizado) que transforma fluxos de recebíveis em ativos negociáveis à vista. É um ativo de Renda Fixa com grande apelo entre os investidores, pela isenção de Imposto de Renda (que pode ser modificada pelo governo).

São VMs lastreados em crédito imobiliários e emitidos exclusivamente por companhias securitizadoras. Sua remuneração é oferecida por taxa prefixada, flutuante ou índice de preços.

Em resumo o CRI transforma fluxos de recebíveis de médio ou longo prazo em ativos financeiros negociáveis à vista. Dessa forma, possibilita que incorporadoras, construtoras, imobiliárias e instituições financeiras que tenham crédito com lastro imobiliário contem com mais recursos para aplicar no segmento.

Há dois tipos de emissão de CRI: as baseadas em contratos performados e aqueles cujo lastro contém contratos não performados. No primeiro caso, os empreendimentos imobiliários que deram origem aos contratos que servem de lastro às emissões já foram concluídos. No segundo, os imóveis ainda não estão finalizados.

Os investidores que optam por CRIs obtém remuneração baseada no fluxo financeiro gerado pelos empreendimentos imobiliários. É diferente da LCI, que tem risco financeiro do próprio emissor (banco). Aqui o risco é do emissor que não é o banco, é o devedor original do crédito (construtora, incorporadora, mutuário final, contratante do aluguel etc.).

O depósito e o registro das CRIs podem ser feitos na CETIP.

Os CRIs têm algumas características definidas em lei e na norma da CVM, como por exemplo o limite por devedor, normalmente 20%. Isso significa que de uma carteira de créditos, um único devedor não poderá responder por mais de 20% dos créditos.

Se o devedor ou coobrigado for Companhia Aberta, Instituição financeira ou equiparada ou se tiver DFs (Demonstrações Financeiras) do exercício anterior à emissão do CRI auditadas por auditor independente registrado na CVM (dispensável se ofertado publicamente para no máximo 50 investidores profissionais), esse limite pode ser superado.

Por isso vemos CRIs com base em recebíveis de uma única empresa como a Petrobras, por exemplo.

Assim como nos CDOs as CRIs podem ser emitidas em tranches Senior e Subordinadas, em que a primeira tem preferência para efeitos de amortização e resgate.

Com relação às garantias, no CRI ofertado a investidores NÃO qualificados, deverá estar em Regime Fiduciário, que é o sistema que permite que os créditos de uma operação realizada por securitizadora imobiliária sejam destinados exclusivamente à remuneração dos CRI lastreados por estes créditos e ao pagamento das despesas oriundas do processo, mantendo-se apartados do patrimônio da securitizadora imobiliária até que se complete o resgate de todos os títulos.

O regime fiduciário provê maior segurança aos investidores de CRI, protegendo-os do risco de falência da securitizadora. 

Este é o regime que permite a uma securitizadora realizar vários tipos de emissões com características distintas, sendo que em todas elas o risco está associado exclusivamente à carteira de crédito imobiliários que lhe servem de lastro. Assim, a deterioração dos créditos que lastreiam uma determinada emissão não afeta a remuneração dos títulos das demais emissões. Foi instalada pelo Lei Federal n° 9.514 (leitura recomendada) que cria o Sistema de Financiamento Imobiliário.

Ainda, se ofertado para investidores NÃO qualificados, os créditos devem ser performados (imóveis com habita-se) ou não performados, que créditos oriundos de promessa de C/V (compra e venda), desde que integrantes de Patrimônio de Afetação (patrimônio exclusivo do empreendimento, separado das demais operações da incorporadora/construtora, conferindo segurança aos adquirentes quando à destinação dos recursos aplicados na obra.).



CRA - Certificado de Recebíveis do Agronegócios

São títulos emitidos exclusivamente por companhias securitizadoras de direito creditórios do agronegócio. Os CRAs têm como principal característica a isenção do Imposto de Renda (IR) para pessoas físicas, desde que permaneçam com o papel até o seu vencimento. Já os ganhos de capital na venda no mercado secundário, durante o tempo de vida do CRA, são tributados.

As pessoas jurídicas que investirem no papel, por sua vez, estão sujeitas às mesmas regras de tributação definidas para títulos de renda fixa, com alíquota regressiva e recolhimento direto na fonte. Criados em 2004, pela Lei 11.076, os CRAs não contam com a cobertura do fundo Garantidor de Crédito.

Os certificados são lastreados em direitos creditórios originários de negócios realizados entre produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros. Os riscos, portanto, estão associados às atividades ligadas ao agronegócio. As garantias existentes em uma emissão de CRA podem estar vinculadas, portanto, à propriedade rural, à safra ou mesmo serem pulverizadas, quando emissores diferentes servem de lastro para um mesmo CRA. O título é nominativo e de livre negociação.

Com a oferta pública permitida para o CRA desde 2012, pela CVM, o papel está disponível somente para investidores qualificados.

Um exemplo de CRA seria o seguinte:

Um grande trader de commodities agrícolas (Louis Dreyfus - LD, por exemplo) tem um grande número de produtores associados. Em vez de financiar diretamente esses produtores ele faz um contrato de compra de produtos agrícolas para a próxima safra. Uma promessa, por exemplo, de compra de R$ 100 milhões em sacas de soja (pode ser em quantidade também). 

O produtor pode ceder esse crédito para a companhia securitizadora que vai vendê-los ao mercado via CRAs.

A captação, como é uma promessa de receber da LD R$ 100 milhões em 1 ano (por exemplo), gera R$ 80 milhões em valor presente para os CRAs, que são colocados em 2 tranches (80% Senior e 20% subordinadas). As cotas subordinadas são totalmente integralizadas pelo próprio produtor, dessa forma ele recebe R$ 64 milhões em dinheiro para financiar sua produção.

Imagine que, por hipótese, os custos do plantio até a entrega do produto à LD tenham sido de R$ 62 milhões. O produtor ficaria com a diferença de R$ 2 milhões do que recebe, mais od R$ 20 milhões dos CRAs que subscreveu na cota subordinada (20% da captação, agora em valor futuro, pago pela LD).

Se houver uma quebra de safra, e a LD pagar apenas R$ 90 milhões (não é default, são menos recebíveis mesmo), as cotas subordinadas suportariam essa quebra no fluxo de caixa, mas ainda assim o produtor conseguirá bancar sua produção e ter algum lucro.

O mundo real é mais complexo e tem contratos mais detalhados (além de que a formação de preço dos CRA's é feita pelo mercado), mas o modelo é basicamente esse.



FIDC - Fundo de Investimento em Direitos Creditórios

O FIDC é um fundo de investimento que deve destinar uma parcelar mínima de 50% do PL para aquisição de direitos creditórios, que são direitos e títulos representativos de créditos, originários de operações realizadas nos segmentos financeiros, comercial, industrial, imobiliários, de hipotecas, de arrendamento mercantil e de prestação de serviços, bem como em outros ativos representativos de crédito.

O restante da carteira deve estar em ativos líquidos, com títulos de emissão do Tesouro, do Bacen, (de estados e municípios), créditos securitizados pelo Tesouro e ativos financeiros de renda fixa (exceto cotas do Fundo de Desenvolvimento Social), operações compromissadas e derivativos, exclusivamente para hedge e sem alavancagem.

Os direitos creditórios divididos por classes:

■  Imobiliários (residencial, comercial, aluguel)
■  Veículos
■  Comerciais (venda de mercadorias / serviços)
■  Industriais
■  Serviços públicos / concessão (luz, gás, telefone, saneamento)
■  Factoring (PF e PJ)
■  Agronegócio
■  Multiclasse

Os tipos básicos de FIDC são os padronizados e os NP, não padronizados, que são baseados em créditos não performados, vencidos, oriundos de ações judiciais em curso, de existência futura - mas oriundo de relações já vigentes, derivativo de crédito não usados para hedge, originados de empresas em recuperação judicial.

Os tipos de condomínio do FIDC são os melhores dos fundos em geral, condomínio aberto (permitido resgate, conforme disposto no regulamento) e fechado (resgate ao término do prazo de duração do fundo, ou na sua liquidação, amortização de cotas e negociação secundária, se disposto no regulamento).

Os FIDC são muitos parecidos com os CDOs americados. São dividos em cotas, da forma seguinte (pode variar):

Senior: possuem preferência em relação às demais para efeitos de amortização e resgate. O parâmetro de rentabilidade é estimado, por exemplo: Até 150% do CDI. A rentabilidade estimada é sempre menor do que a rentabilidade das outras tranches.

Mezanino: preferência somente em relação às subordinadas, rentabilidade estimada de valor intermediário (170% do CDI).

Subordinada: última a ser resgata / amortizada, rentabilidade restante, de valor maior, não precisa de meta, pois receberá o que sobrar e geralmente é adquirida pelo cedente dos créditos, como forma de commitment (compromisso).

O público alvo dos FIDCs são os investidores qualificados.

Já falamos algumas vezes sobre investidores qualificados e profissionais, é interessante tratar dessas diferenciações, dada pela Instrução CVM 554.

São investidores qualificados:

I - Investidores profissionais; 

II - Pessoas ou jurídicas que possuam investimentos financeiros em valor superior a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) e que, adicionalmente, atestem por escrito sua condição de investidor qualificado mediante termos próprio; 

III - As pessoas naturais que tenham sido aprovadas em exames de qualificação técnica ou possuam certificações aprovadas pela CVM como requisitos para o registro de agentes autônomos de investimento, administradores de carteira, analistas e consultores de valores mobiliários, em relação a seus recursos próprio;

IV - Clubes de investimento, desde que tenham a carteira gerida por um ou mais cotistas, que sejam investidores qualificados.

Esse investidor tem acesso a produtos de investimento diferenciados, com gestão especial e custos mais baixos que os ofertados pelos bancos ao público em geral. Para ter acesso a esses produtos, o investidor deve assinar um termo de responsabilidade pelo investimento e declarando que tem conhecimento e compreensão ao que àqueles determinado investimento se aplica.

São considerados investidores profissionais:

I - Instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil;

II - Companhias seguradoras e sociedades de capitalização;

III - Entidades abertas e fechadas de previdência complementar;

IV - Pessoas naturais ou jurídicas que possuam investimentos financeiros em valor superior a R$ 10.000.000,00 e que, adicionalmente, atestem por escrito sua condição de investidor profissional mediante termo próprio;

V - Fundos de investimentos;

VI - Clubes de investimento, cuja carteira seja gerida por administrador de carteira autorizado pela CVM;

VII - Agentes autônomos de investimento, administradores de carteira, analistas e consultores de valores mobiliários autorizados pela CVM, em relação a seus recursos próprios;

VIII - Investidores não residentes. 

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