MPU - 2013 - ECONOMISTA - Questão 109

109 - Nos dois primeiros meses, março e abril, do Plano Cruzado, não ocorreu aumento dos salários reais embora tenham sido concedidos pelo governo aumento do salário mínimo e abono salarial, o que comprova a manutenção do baixo uso da capacidade industrial instalada em 1986.

Resolução:

O plano Cruzado so foi adotado no segundo ano do governo Sarney.

Analiticamente, existiam quatro grandes grupos de medidas no Plano Cruzado:

Reforma Monetária e Congelamento: ficou estabelecido o cruzado como novo padrão monetário nacional. A mudança tinha basicamente dois propósitos: 1) criar a imagem de uma nova moeda, forte; 2) permitir a intervenção nos contratos, já que ficava estabelecida uma nova unidade monetária. Os preços de todos os produtos ficavam congelados a partir de 28 de fevereiro, e a taxa de câmbio vigente no dia anterior ao Plano ficou igualmente fixa.

Desindexação da Economia: as obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN foram extintas e substituídas pelas obrigações do tesouro nacional - OTN, cujos valores ficariam congelados por um ano. Ficava proibida terminantemente a indexação de contratos com prazos inferiores a um ano. Todas as obrigações financeiras continuavam a ser denominadas na velha moeda (cruzeiro), que era desvalorizada diariamente em relação ao cruzado. O objetivo desta era acabar com o problema da expectativa de inflação embutida nas obrigações financeiras, evitando transferência de renda entre credores e devedores.

Índice de Preços e Cadernetas de Poupança: houve deslocamento do período de apuração do índice de preços ao consumidor IPCA, que passou a ser denominado Índice de Preços ao Consumidor (IPC). O objetivo era eliminar a contaminação do índice pela inflação do mês de fevereiro. As cadernetas de poupança passavam a ter rendimentos trimestrais, e não mensais. Aparentemente, o intuito dessa medida era evitar o fenômeno da ilusão monetária.

Política Salarial: os salários em cruzado deveriam ser calculados pela média dos últimos seis meses em valores correntes. Os salários ficavam oficialmente congelados, podendo os empresários decidir por aumentos caso a caso, através de negociações. Para evitar que os trabalhadores acumulassem perdas, foi criado o gatilho salarial, que garantia a correção imediata sempre que a inflação acumulasse 20%.  O reajuste porém não poderia exceder os 20%, ainda que a variação acumulada do IPC superasse esse percentual, sendo o excedente computado nos reajustes subsequentes.

O sucesso inicial do Plano Cruzado foi estrondoso. Os índices de preços ao consumidor, que, em fevereiro de 1986, estavam em torno de 15% ao mês, baixaram para praticamente zero nos meses subsequentes. Houve crescimento de 20% nos postos de trabalho criados  no primeiro quadrimestre de 1986, contra igual período de 1985.

Além da expansão do emprego, o temor de interromper a produção diante da explosão de consumo que se seguiu ao Plano fez com que alguns empresários concedessem aumentos salariais adicionais aos do abono, sob ameça de greve. O problema é que esse aumento se deu em cima de uma demanda já aquecida. O nível de utilização de capacidade - que no final de 1985, já estava elevado para os padrões dos anos anteriores - começou a crescer rapidamente. A demanda ja estava crescendo - e esse movimento foi intensificado após o lançamento do Cruzado. Nos primeiros trimestres de 1986, o nível de utilização passou para 81%, e atingiu 86% no quarto trimestre de 1986.

No que se refere à evolução das contas fiscais, houve uma melhora imediatamente após a estabilização do Brasil. Isso se deve a um aumento da arrecadação tributária devido ao crescimento da economia e ao fim do efeito Tanzi. Houve também forte redução das despesas com juros reais, embora os gastos não financeiros tenham se elevados. O resultado foi praticamente a manutenção das despesas totais. Entretanto, os resultados ficais positivos no ano foram logo revertidos, já em 1987, tendo se observado poupança negativa até 1989.

A outra suposição do plano era de que a oferta de moeda poderia crescer de forma a acomodar a nova demanda por moeda, sem que isso tivesse quaisquer impactos inflacionários. Logo se tornou claro, porém, que o governo tinha provocado uma expansão exagerada da oferta de moeda. As taxas de juros reais se tornaram negativas e ocorreu um processo de valorização expressiva dos ativos financeiros. A redução das taxas de juros estimulou ainda mais a expansão do crédito, levando a um boom de consumo, mas aqui agravados pelos abonos salariais concedidos e pelo próprio temor de que a estabilização fosse passageira.

Diante de uma demanda muito aquecida, cedo começaram a surgir os sinais de desabastecimento da economia. Produtos que foram congelados com defasagem em relação à média do período anterior foram os primeiros a desaparecer.

A equipe econômica do governo logo percebeu os perigos embutidos no superaquecimento da economia. Alguns defendiam o descongelamento de alguns preços, o que seria muito difícil de administrar, outros o descongelamento total, o que acionaria o gatilho salarial e acabaria provocando um boom. Havia ainda os que defendiam que tudo não passava de um surto de demanda temporário.

Em meio a isso tudo, em 23 de julho de 1986, surgiu o cruzadinho.

O cruzadinho consistia num pacote fiscal para desaquecer o consumo e, ao mesmo tempo, financiar um plano de investimento em infraestrutura e metas sociais, considerado prioritário pelo presidente Sarney. Os aumentos de preços provocados pelo pacote, porém, foram expurgados do índice oficial de inflação - a fim de evitar o acionamento do gatilho salarial.

O descontentamento com o pacote foi geral. Era insuficiente para desaquecer o consumo e não conseguiu arrecadar o suficiente para financiar o programa de investimento anunciado pelo governo.

Diante do desabastecimento, o governo recorreu as importações. Como o país não tinha o habito de tal prática, houve congestionamentos nos portos e demora para entrega de produtos. Na realidade, a balança comercial apresentou superávits nos primeiros meses do plano. Essa situação se alterou no segundo semestre com a queda das receitas de exportações e o aumento das importações, em função da defasagem cambial em termos reais e do rápido crescimento do produto.

Em novembro de 1986, uma semana após o PMDB ter vencido as eleições, foi anunciado o Cruzado II.

O cruzado II era um novo pacote fiscal, com o objetivo de aumentar a arrecadação em 4% do PIB. O governo anunciou o aumento de impostos indiretos em produtos da ''ponta'' do consumo. A ideia do governo consistia em aumentar, basicamente, preços de bens finais, com o objetivo de evitar repasses ao longo da cadeia produtiva. Entretanto, além desses, tinham sido autorizadas remarcações nas tarifas de energia elétrica, telefones e tarifas postais. O governo ainda tentou expurgar novamente os aumentos, mas isso se tornou politicamente inviável.

O cruzado II foi a válvula de escape para o abandono do congelamento. Os preços começaram a ser corrigidos e a taxa mensal de inflação em janeiro de 1987 atingiu 16,8%. A consequência foi o acionamento do gatilho salarial. O fim oficial do plano Cruzado ocorreu em fevereiro de 1987, com a decretação da extinção do congelamento. Finalmente, com a expressiva piora das contas externas, foi decretada, em fevereiro de 1987, moratória dos juros externos.

De acordo com os próprios ''pais'' do Cruzado, houve vários erros na concepção e na própria condução do Plano, a saber:

1) O diagnóstico de que a inflação era ''puramente inercial'' estava equivocado.

2) Antes da introdução do plano, a inflação já estava se acelerando; os abonos salariais contribuíram para reforçar a explosão de consumo que normalmente ocorre após a estabilização;

3) A condução das políticas monetária e fiscal foi excessivamente frouxa, o que poderia ter evitado o aquecimento da demanda;

4) O congelamento durou demasiadamente: 11 meses;

5) Diferentemente dos salários, os preços foram congelados em seus níveis correntes e não médios, introduzindo diversas distorções de preços relativos;

6) O gatilho salarial reintroduziu e agravou a questão da indexação dos preços;

7) A chamada 'economia informal'' ficou fora do congelamento, o que contribuiu para desalinhar ainda mais os preços relativos;

8) A manutenção do câmbio fixo de fevereiro até novembro, somado ao crescimento da demanda, fez com que as contas externas se deteriorassem;

9) A existência de uma defasagem nos preços públicos no momento do congelamento piorou a situação fiscal do governo.

Gabarito: Errado, 

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