FGV - OAB UNIFICADO - Nacional/XXVIII Exame/2019 - QUESTÃO 12

Os negócios de Clésio vão de mal a pior, e, em razão disso, ele toma uma decisão difícil: tomar um empréstimo de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) com Antônia, dando, como garantia de pagamento, o penhor do seu relógio de ouro e diamantes, avaliado em R$ 200.00,00 (duzentos mil reais). Antônia, por sua vez, exige que, no instrumento de constituição do penhor, conste uma cláusula prevendo que, em caso de não pagamento da dívida, o relógio passará a ser de sua propriedade. Clésio aceita a inserção da cláusula, mas consulta seus serviços, como advogado(a), para saber da validade de tal medida.
Sobre a cláusula proposta por Antônia, assinale a afirmativa correta.

a) É válida, tendo em vista o fato de que as partes podem, no exercício de sua autonomia privada, estipular esse tipo de acordo. 

b) É nula, tendo em vista o fato de que o Código Civil brasileiro proíbe o pacto comissório. 

c) É válida, uma vez que Clésio como proprietário do bem, não está impedido de realizar o negócio por um preço muito inferior ao de mercado, não se configurando a hipótese como pacto comissório. 

d) É válida, ainda que os valores entre o bem dado em garantia e o empréstimo sejam díspares, nada impede sua inserção, eis que não há qualquer vedação ao pacto comissório no direito brasileiro.

Resolução:

Questão tranquila, que exigiu do(a) candidato(a) o conhecimento do chamado pacto comissório real, também chamado de cláusula comissória, ou seja, a cláusula que autoriza(ria) o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar com o objeto dado em garantia na hipótese de a dívida não ser paga na data do vencimento, sendo certo que tal cláusula é expressamente vedada pela ordem jurídica, conforme art. 1.428, caput, CC/2002:
Art. 1.428. É nula a cláusula que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar com o objeto da garantia, se a dívida não for paga no vencimento.
Parágrafo único. Após o vencimento, poderá o devedor dar a coisa em pagamento da dívida.
De acordo com Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (Curso de direito civil: direitos reais. 13. ed. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 842), citando magistério de Marco Aurélio Bezerra de Melo (Novo Código Civil anotado: direito das coisas. Volume V. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 324):
[...] a proibição de justifica, pois se a cláusula contratual pudesse produzir efeito, estaria o ordenamento jurídico referendando um possível enriquecimento sem causa e incentivando a usura, em detrimento dos legítimos interesses do devedor e da própria sociedade, uma vez que é totalmente possível que o bem dado em garantia supere, em muito, o montante da dívida. Outra razão justificadora pode ser encontrada na proibição constitucional processual do devido processo legal, de vez que o art. 5°, LIV, da CRFB veda a perda forçada de bens sem o devido processo legal.
Passemos à questão em si...

Os negócios de Clésio vão de mal a pior, e, em razão disso, ele toma uma decisão difícil: tomar um empréstimo de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) com Antônia, dando, como garantia de pagamento, o penhor do seu relógio de ouro e diamantes, avaliado em R$ 200.00,00 (duzentos mil reais). Antônia, por sua vez, exige que, no instrumento de constituição do penhor, conste uma cláusula prevendo que, em caso de não pagamento da dívida, o relógio passará a ser de sua propriedade. Clésio aceita a inserção da cláusula, mas consulta seus serviços, como advogado(a), para saber da validade de tal medida.

Sobre a cláusula proposta por Antônia, assinale a afirmativa correta.

a)  É válida, tendo em vista o fato de que as partes podem, no exercício de sua autonomia privada, estipular esse tipo de acordo.

ERRADA. Embora não se desconheça a vigência do princípio da autonomia privada no âmbito das relações negociais, é certo que não é ele ilimitado e irrestrito, encontrando, portanto, balizas em função de normas de ordem pública, bem como em razão de outros princípios expressamente albergados na Constituição Federal e no próprio Código Civil.

b)  É nula, tendo em vista o fato de que o Código Civil brasileiro proíbe o pacto comissório.

CORRETA. Consoante previsão do art. 1.428, caput, CC/2002.

c)  É válida, uma vez que Clésio como proprietário do bem, não está impedido de realizar o negócio por um preço muito inferior ao de mercado, não se configurando a hipótese como pacto comissório.

ERRADA. Pela definição acima exposta, percebe-se, claramente, que o enunciado traz um típico exemplo de pacto comissório.

d)  É válida, ainda que os valores entre o bem dado em garantia e o empréstimo sejam díspares, nada impede sua inserção, eis que não há qualquer vedação ao pacto comissório no direito brasileiro.

ERRADA. Como já destacado, o pacto ou cláusula comissória real é expressamente vedado no direito brasileiro (art. 1.428, caput, CC/2002).



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