PODER HIERÁRQUICO




O desempenho eficiente da função administrativa requer que haja distribuição de competências e escalonamento entre órgãos, cargos e atribuições. Para que haja harmonia e unidade de direção, se estabelece uma relação de coordenação e subordinação entre os diversos níveis, ou seja, se estabelece uma relação de hierarquia.

Uma relação de hierarquia caracteriza-se pela existência de níveis de subordinação entre órgãos e agentes públicos, sempre no âmbito de uma mesma pessoa jurídica. É o caso, por exemplo, da relação entre um Ministério e respectivas secretarias e demais órgãos administrativos, ou entre um chefe de departamento e os funcionários desse setor.

Nesse contexto, o poder hierárquico é aquele que permite ao superior hierárquico exercer determinadas prerrogativas sobre seus subordinados, especialmente as de dar ordens, fiscalizar, controlar, aplicar sanções, delegar e avocar competências. Vamos ver um pouco mais sobre cada uma dessas prerrogativas.

A prerrogativa de dar ordens permite ao superior hierárquico assegurar o adequado funcionamento dos serviços sob sua responsabilidade. Também é conhecida como poder comando.

Além de ordens diretas, verbais ou escritas, direcionadas a um subordinado específico, o poder de comando também pode ser exercido mediante a edição de atos administrativos ordinários, como ordens de serviço, portarias, instruções, circulares internas etc., que obrigam de forma indistinta todos os subordinados aos quais se destina.

Por seu turno, os subordinados se sujeitam ao chamado dever de obediência, isto é, ao dever de acatar as ordens emitidas por seus superiores hierárquicos, exceto quando estas ordens forem manifestamente ilegais.

Prosseguindo, a prerrogativa de fiscalizar permite ao superior acompanhar, de modo permanente, a atuação de seus subordinados. Trata-se, na verdade, de um poder-dever, ou seja, mais que uma prerrogativa, é uma obrigação do superior fiscalizar a atuação dos seus subordinados.

Como decorrência lógica do poder de fiscalizar, existe o poder de controle, que permite ao superior tomar medidas concretas face às constatações surgidas no acompanhamento das atividades de seus subordinados. O poder de controle compreende, assim, a manutenção dos atos válidos, convenientes e oportunos, a convalidação de atos com defeitos sanáveis, a anulação de atos ilegais e a revogação de atos discricionários inoportunos ou inconvenientes.

O controle hierárquico permite que o superior aprecie todos os aspectos dos atos de seus subordinados, não se restringindo, assim, a questões de legalidade, mas também abrangendo o mérito administrativo.

Pode o superior, por exemplo, por razões de conveniência e oportunidade, não concordar com determinada proposta formulada por subordinado seu, decidindo de forma diversa.

Detalhe é que o controle hierárquico pode ocorrer de ofício ou mediante provocação dos interessados, por meio de recursos hierárquicos.

Quanto à aplicação de sanções, registre-se que só decorrem do poder hierárquico as sanções disciplinares, quais sejam, aquelas aplicadas aos servidores públicos que cometam infrações funcionais. Assim, as sanções aplicadas a particulares não têm como fundamento o poder hierárquico, afinal, não há hierarquia entre a Administração e os administrados. Tais sanções (aos particulares) decorrem do exercício do poder disciplinar ou do poder de polícia, conforme o caso. Falaremos mais sobre isso daqui a pouco.

Em relação à delegação de competências, refere-se ao ato pelo qual o superior hierárquico confere o exercício temporário de algumas de suas atribuições a um subordinado. A delegação de competências é um ato discricionário e, por isso, revogável a qualquer tempo. Dizendo de outra forma, o superior pode, dentro dos limites da lei, delegar as competências que desejar, em razão de circunstâncias de índole técnica, social, econômica, jurídica ou territorial, podendo, da mesma forma, revoga-la quando quiser, retirando do subordinado os poderes para praticar os atos delegados.

Ressalte-se que a delegação transfere o mero exercício de uma competência, permanecendo a titularidade dessa competência com a autoridade delegante, a qual não pode renunciar a suas responsabilidades, visto que elas sempre decorrem de lei.

Nem todas as competências, porém, podem ser delegadas. Exemplos clássicos de competências indelegáveis são os atos políticos (somente se delega atos administrativos) e as funções típicas de cada Poder, salvo nos casos expressamente previstos na Constituição (por exemplo, no caso das leis delegadas, em que o Presidente da República poderá exercer função legislativa, nos termos do art. 68 da CF).

Já a avocação é ato discricionário, de caráter excepcional, mediante o qual o superior hierárquico atrai para si o exercício temporário de determinada competência exercida por um subordinado. Assinale-se que a avocação desonera o subordinado de toda responsabilidade pelo ato avocado pelo superior.

Detalhe importante é que não há hierarquia entre diferentes pessoas jurídicas. É o que ocorre, por exemplo, na relação entre as entidades da Administração indireta e os respectivos Ministérios supervisores (aqui, como já sabemos, não há hierarquia; há apenas vinculação para fins de controle finalístico, nos termos da lei).

A hierarquia é característica associada ao desempenho da função administrativa, típica do Poder Executivo. Nesse ponto, vale lembrar que nos demais Poderes também existem órgãos administrativos, igualmente organizados em níveis de hierarquia, ou seja, Judiciário e Legislativo, assim como Ministério Público e Tribunal de Contas, também fazem uso do poder hierárquico quando desempenham atividades administrativas.

Entretanto, não existe hierarquia no exercício das funções típicas dos Poderes Judiciário e Legislativo, não no sentido de coordenação e subordinação Com efeito, no Judiciário, embora haja distribuição de competências entre instâncias, cada uma funciona com independência em relação à outra no exercício da função jurisdicional: o juiz da instância superior não pode se sobrepor ao de instância inferior, nem lhe dar ordens ou revogar decisões por ele adotadas. No Legislativo, de forma semelhante, a distribuição de competências entre Câmara e Senado não cria relação de subordinação funcional entre as duas Casas.

Também não existe hierarquia entre os Poderes da República. Por exemplo, não há relação hierárquica entre agentes e órgãos administrativos do Poder Legislativo, de um lado, e agentes e órgãos administrativos do Poder Executivo ou do Poder Judiciário, de outro.

Tampouco existe hierarquia entre a Administração e os administrados, pois a relação entre eles depende de lei ou de vínculos contratuais específicos, mas sem características de subordinação.

Por fim, importante ressaltar que o poder hierárquico não depende de lei que expressamente o preveja ou que estabeleça o momento do seu exercício ou os aspectos a serem controlados. Ele é inerente à organização administrativa hierárquica, possuindo caráter irrestrito, permanente e automático. Nesse aspecto, difere da tutela administrativa, exercida pela administração direta sobre as entidades da administração indireta, que só pode ser exercida nos termos e limites previstos em lei.




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